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robindotelhado
quarta-feira, janeiro 28, 2004
 
Olá amiguinhos, queiram V. Exas. aceitar as minhas humildes, sentidas e sinceras desculpas por estes poucos dias de ausência, mas o balneário anda a meter água por todo o lado e não sabemos para onde nos virar, melhor dizendo, flutuar.

Para que me perdoem, vou-vos aguçar o apetite relatando a breve história de um molusco.
Advirto desde já que a história deste pequeno bivalve nada tem de feliz, já que tal como muitos outros da sua espécie acabou no tacho.
Calma, não é assim tão triste, pois que não morreu dentro do dito. Revelando uma extraordinária capacidade de sobrevivência, conseguiu salientar-se junto dos demais e, de cabeça de fora do testo, não só não foi cozinhado, como foi cozinhando os outros.

Seguindo a curta tradição bloguista, bota dicionário no assunto: vieira: s.f. (Do lat. veneria) molusco lamelibrânquio muito utilizado na alimentação, também conhecido por leque.

A história deste pequeno bivalve lamelibrânquio começa pela sua ausência de nome próprio, mantendo dessa forma a tradição de família.
O certo é que não carecia dele para se distinguir dos seus semlhantes, pois que, para tal, bastava exibir os seus cabelos côr de mel.
Passou, por tudo isto, a ser conhecido como a vieira Vieira.

Da infância não se lhe conhecem grandes histórias. Passou despercebido na vilória de onde era natural.

Na adolescência, denotando um espírito prático, característica que não mais abandonou, depressa concluiu que, sendo um molusco, o seu fim quase certo era acabar por ser comido. Confrontado com tal sorte, resignou-se e conseguiu a proeza de ter sido o primeiro molusco inscrito num curso de culinária, ministrado pelo Chefe Silva.

Concluído o curso, aliás com distinção, depressa viu que a indústria hoteleira das berças não era merecedora de receber o seu talento. A capital era o seu destino.

Não tinha dúvidas. Encontraria rapidamente um emprego com pouco trabalho e ali se orientaria, com a vantagem de nunca perder o contacto com a água, já que dela precisava para viver.

E assim foi, apanhando uma forte corrente do rio que banhava a sua vilória, que naquele tempo ainda as havia, deixou-se seguir até ao mar. Daí até à 24 de Julho foi um ver-se-te-avias.

Não foi sol de muita dura. Apesar de munido do seu diploma, a cidade, ingrata, não lhe reconheceu os méritos de chéf.

Estava na hora de partir, mas.... Para onde havia de ira a nossa Vieira?
Como um mal nunca vem só, a sua terra, distante e bucóilica, com as folhas de ameeiro suspensas sobre a água límpida do rio que a banhava, via-se envolvida num tortuoso processo de (quase) revolução política.

Não pestanejou ou hesitou um segundo que fosse. Apegando-se ao casco de um veleiro pertença de um dos muitos empresários falidos da região, regressou ao berço.

Os bivalves da sua família, porém, não gostaram do seu regresso apressado. Nunca lhe haviam de perdoar não se ter afirmado junto dos sulistas ingratos e incapazes de reconhecer um talento daqueles.

Apressados, os vis bivalves reuniram-se e, sumariamente, ditaram a sentença: o tacho. Já que havia logrado cozinhar para ninguém, haveria ele próprio de ser cozinhado.

Como se não bastasse a injustiça prestes a concretizar-se, a comissão de bivalves deliberou que o tacho fosse cozinhado junto das águas, por ser o seu meio de eleição.

Dura lex sed lex, arremessaram a pobre criatura para o interior do grande tacho e colocaram-no, tal como a muitos outros infelizes de má sorte, junto às termas existentes no concelho.

Mas a vieira Vieira haveria de singrar na vida. Apegando-se ao já referido instinto de sobrevivente, conseguiu, como já relatei, pôr a cebaça de fora, queimando todos os outros com o fogo que lhe estava destinado.

A partir desse dia, não mais deixou de engordar - e tão magro ele era - animando todos quantos por lá passavam e eram muitos.

Apanhado numa maré de sorte, pois não mais voltaria a ser infeliz, conseguiu receber um patrocínio de uma operadora móvel, como recompensa por ter sobrevivido.
A partir desse dia foi vê-lo sempre empunhado o seu aparelho, ostentando-o para que todos o vissem e ouvissem, vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana, trezentos e sessenta e cinco dias por ano.

Há quem diga que ainda hoje mantém o dito patrocínio, não se lhe conhcendo outra ocupação que não seja vociferar para o interior do celular.

Daqui para a frente não conheço a história do nosso lamelibrânquio, mas estou certo que os que o condenaram, mais cedo ou mais tarde vão voltar a tentar metê-lo noutro tacho.

Aposto, contudo, que conseguirá, de novo, sobreviver.

Saudações lamelibrânquias, para variar um pouco.
 
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S. Pedro do Sul, Viseu

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