DEPOIS DA VIGA, OS PILARES
Mais cedo ou mais tarde eu sabia que isso ia acontecer. Era inevitável.
A obsessão por objectos hirtos era evidente.
Para além disso, já o tinha ouvido a trautear: «depois da viga, vêm os pilares, depois da viga, vêm os pilares!».
Não me enganei.
Ainda a viga não assentou na sua plenitude e o homem já pensa em pilares. Está imparável.
Em entrevista ao jornal Gazeta da Beira (penso que é o único de S. Pedro do Sul), o nosso presidente teve a ideia peregrina de dizer que, em breve, S. Pedro do Sul será uma cidade, cujos pilares balizadores serão esta vila e as Termas. Fantástico. Bombástico. Estrondoso.
Depois do vereador do cabelo no ar ter dito que as nossas Termas eram comparáveis às de Vichy, o presidente quer transformar a nossa vilória em cidade. Fantástico. Bombástico. Estrondoso, repito.
As consequências de uma declaração como esta podem ser as mais variadas.
A
primeira que retiro entristece-me profundamente. A mim e aos outros 3 leitores assíduos dos blogues sampedrenses.
Afonsinho, Afonsinho, vai ter de mudar o nome do seu blogue. Cidadeirrisória.blogspot.com. Vai perder a piada toda. A conjugação da vilória com o adjectivo irrisório era, por si só, engraçada. Permitia-nos ver, sem mais, o teor do blogue. Cidade irrisória não tem piada nenhuma.
Aconselho-o a instaurar um processo contra o Tó Carlos pela perda de leitores que vai ter.
A
segunda consequência não me deixa mais contente. Penso, como o Tó Carlos, naqueles que já nos deixaram. Aqueles que tiveram a infelicidade de morrer sem verem dois automóveis a cruzar-se na nova ponte. Já pensaram nesta pobres almas? O que não deverão sentir se, no outro mundo, se aperceberem que, caso fossem vivos, poderiam dizer: «vamos à cidade ver o carros a cruzarem-se na ponte?».
É (mais) uma tradição que vai à viola. Como acredito que S. Pedro vai mesmo ser uma cidade (talvez dentro de um mês, quem sabe 15 dias), penso já com algum saudosismo naqueles velhotes de bigodes retorcidos, de cajado na mão, a dizerem: «hoje vamos à vila».
A consequência que segue, a
terceira, prende-se também com as pessoas de mais idade.
Uma cidade que se preze tem de ter transportes públicos. Mais uma empresa municipal para a gerir. Mais uns genros para lá pôr como administradores.
Já pensaram na alegria que os residentes da aldeia da Pena vão ter quando virem um autocarro de 60 lugares a chegar ao fundo da encosta, com as letras EMTUSPS (Empresa Municipalizada de Transportes Urbanos de São Pedro do Sul)?
O facto do autocarro ter de subir a encosta de marcha à ré, por falta de espaço para virar, não retira em nada a alegria dessa gente, sendo até um sinal de perseverança.
A
quarta e última, outras se seguirão, à medida que o projecto for tomando corpo, é a futura cidade ser compreendida entre o pilar Termas e o pilar S. Pedro do Sul. Será um caso único na Europa. A estrada nacianal Termas-S. Pedro do Sul será uma espécie de Avenida Europa.
Já imagino os aquistas de Vichy a trocarem esta estância e, em hordas, virem passear para nossa Avenida Europa. Imagino a Louis Vuitton e a Yves Saint Laurent a abrirem galerias ao lado das oficinas dos Cristos, um hipódromo em redor das instalações da padaria de Várzea, um casino (estilo Monte Carlo) ao pé da sucata depositada ao pé do antigo matadouro.
Enfim, sonho extasiado com as expectativas criadas por tão insigne autarca. São promessas com estas que nos fazem sonhar, que criam emprego e nos dão vontade de trabalhar.
Vamos em frente, mãos à obra.
Vivam os pilares. Viva a cidade de S. Pedro do Sul!