O RABO
Estou desolado.
Depois de tanto maldizer dos andantes e errantes, cheguei à conclusão que os franceses – pelo menos os de Nice -, no que toca a matéria de higiene, pouco diferem daqueles. Quero eu dizer, são igualmente avessos à água.
Pernas para que te quero, pensei. Se o pensei, melhor o fiz, pois o V 12 do meu Jaguar só se apagou em plena Piazza della Signoria, em Florença.
Cansado de tanta condução e dando uma de turista de pé descalço, livrei-me da mina camisa Dolce & Gabana e das minhas calças Versace. Em sua substituição, vesti umas Levis compradas na Feira do Relógio e uma camisa Sacoor da Feira de Espinho.
Senti-me mais à vontade. Mais ao nível das multidões de nipónicos que invadiam a praça munidos de irritantes Nikon digitais que não paravam de disparar fotografias em todas as direcções.
Munido de uma garrafa de água mineral, afastei-me para junto do Palazzo Vecchio para me deleitar com o principal motivo da minha deslocação à Piazza della Sigboria: a estátua de David de Miguel Ângelo .
Apesar de ser uma réplica, pois que a verdadeira está arredada dos olhos dos turistas vulgares como eu, visionei atentamente todos os pormenores daquele enorme bloco de mármore minuciosamente esculpido.
Atentei nas mãos, que ostentavam as grossas veias do jovem herói que desafiou e derrotou os Filisteus. Analisei a assimetria da estátua, um lado em repouso e outro em clara tensão, como que antevendo a batalha que se avizinhava.
De repente, dei por mim a pensar nos nossos imperadores, governantes longínquos da nossa vilória. Não sei qual a associação, mas penso que foi o órgão mirrado e pendente do David, em claro contraste com as restantes partes da estátua, que me conduziu a tão vis personagens.
Um trago de água depois, bebido à sombra, e jurei a mim mesmo que não mais iria pensar na poltiquice local. No entanto, ao limpar as gotículas de suor que se acumulavam na minha testa, vislumbrei o rabo da estátua do David.
Para os que não sabem, rabo é, segundo o meu dicionário, «um apêndice ou extremidade posterior móvel do tronco de muitos animais, nuns peludo, noutros coberto de escamas, penas...».
Como uma coisa leva inevitavelmente à outra, dei por mim a pensar na omissão do meu dicionário, a primeira de que dava conta.
Porque gosto da crítica construtiva e muito me orgulharia de poder contribuir para a Academia das Ciências de Lisboa, comecei a pensar nas várias funções que um rabo pode ter.
A mais óbvia, serve para assentar a parte superior do nosso corpo sobre o redondo da sanita e, prendendo a resppiração, contrair os músculos abdominais, expelindo toda a merda que se vai acumulando no seu interior.
A seguinte, para emitir sons desagradáveis, quase sempre acompanhados de cheiros nauseabundos, uns mais que outros, consoante o que se ingere.
Occoreu-me também servir para ser esfregado com papel Scotex de dupla folha - aquele do anúncio do Labrador.
Depois, lembrei-me dos cuidadosos progenitores que, em vez de dispararem uns valentes bofetões nas trombas das criancinhas, apostam numas palmadas no dito cujo.
Por fim, lembrei-me de uma utilização não tanto usada, mas que caiu na moda há uns anos mercê dos dotes cinematográficos de um conhecido arquitecto nacional.
Esgotadas as possíveis utilizações que encontrei para os rabos, de certeza que outras existirão, lembrei-me de uma outra, ainda que, para tal, tenha sido forçado a recorrer à nossa vilória.
Pois é, lembrei-me daquela pessegada – laranjada, para quem preferir este fruto – de tentarem eleger um rabo para autarca.
Penso que se tratava de um rabo feminino. E digo penso porque, ao contrário de todos os restantes candidatos, que se apresentavam de frente para o eleitorado, aquele estava de costas, ostentando o seu enorme rabo para os votantes.
Pelas formas arredondadas e voluptuosas depressa concluí ser de alguém do sexo feminino. Só podia. Só lhe faltavam uma pegas. Sim, com tal imensidão, só assim se poderia abarcar, abraçar e desfrutar.
Confesso que nunca cheguei a descobrir quem era, pois, após minuciosa vistoria aos rabos dos eleitos – com a devida distância, bem entendido – conclui que o rabo da fotografia não tinha sido eleito.
Ainda hoje lanço mezinhas ao gajo do marketing político que a decidiu incluir na lista. Que raio de ideia, aproveitarem-se de um rabo para sacar uns votos. Ainda se mostrassem a cara da dona para ver se condizia...
Será que a moça não tinha mais nada que se aproveitasse. Com um rabo daqueles decerto tinha alguma coisa na cabeça, nem que fosse o savoir faire de o espetar daquela forma. Era um total deleite vê-lo balouçar sobre aquelas pernas esguias. Nem era precisa música para nos fazer tilintar o cerebelo. Fenomenal!
Qual Miguel Ângelo qual quê. Qual David qual quê.
Os paizinhos da cachopa devia ser brindados com o subsídio que todos os anos vai para o Pavilhão da família Fêguê isto é, para o Pavilhão gerido pela Associação XPTOVXZ. Quanto mais não fosse por o terem concebido sem o recurso a ferramentas exteriores aos próprios corpos.
Com um rabo daqueles – posso dizer cu? – as eleições estão ganhas.
Pensando bem, o melhor é continuarem sem identificar a dona, não vá a rapaziada apanhar alguma desilusão, descobrir que tem ou teve dono. Assim sempre são mais uns votitos que lá caiem, na esperança de o ver a subir a imensa escadaria. Sugiro apenas que lhe enfiem uma saia pequenina, pequenina, ao estilo daquela deputada italiana de há uns anos que era maluca por fruta e chocolate.
Vão ver que assim as eleições já estão no rabo, quero dizer, no papo.
Que se cuide a rapaziada do PS. Já não falta muito. Não arranjem um rabo à altura e vão ver o que vos acontece. Cuidado! Podem ser politicamente enrabados. Sem malícia, claro está.
Ciau!